

Eu penso que não há dúvidas de que o ambiente tem um impacto em toda a gente, seja numa escola, em casa ou nos hospitais. O bem-estar e a arquitetura estão ligados, não há dúvida.”
Zaha Hadid
Zaha Hadid nasceu em Bagdá em outubro de 1950. Formou-se em matemática na Universidade Americana de Beirute. Após se graduar, começou a estudar na Architectural Association de Londres, e logo depois passou a estabelecer prática profissional própria em Londres. Vencedora de diversas competições internacionais, alguns de seus projetos vencedores nunca foram construídos: como The Peak Club em Hong Kong (1983) e a Ópera da Baía de Cardiff em Gales, por exemplo. Em 2004, Hadid se tornou a primeira arquiteta mulher a receber o Prêmio Pritzke de Arquitetura - o "prêmio Nobel" da área arquitetônica - pelo conjunto de sua obra. De alguns anos para cá, foram concluídas, com muitos olhares voltados, obras suas mundo afora. Algumas são resultados de concursos, outras foram feitas por convite.
Zaha Hadid é, atualmente, um dos nomes de maior relevância da arquitetura mundial, possui obras construídas em vários lugares diferentes do mundo, projetos que vão de uma plataforma de esqui na Áustria até uma estação de trem com complexo de estacionamento de carros na França, passa tambem por um museu - o Centro Rosenthal para Arte Contemporânea, nos EUA.
Entre seus inúmeros trabalhos de arquitetura e moda idealizados e ainda não realizados está um museu - MAXXI, sinuoso, de linhas contínuas, torcidas e acompanha o mesmo espírito de sua arquitetura orgânica e descontrutivista do movimento do Desconstrutivismo, que teve início no final dos anos 80 e contou com representantes ilustres como Frank Gehry -. O Museu Nacional das Artes do Século 21, em Roma, inaugurado em 2009, é considerado por Zaha um de seus projetos mais empolgantes, entre os mais ou menos cem projetos em andamento pelo escritório dela atualmente. Zaha diz: “Não é mais apenas um museu, mas um centro com muitas galerias e espaços que estão entrelaçados e superpostos uns sobre os outros”.
Zaha afirma que o Brasil, por conta do arquiteto Oscar Niemeyer, assume forte influência em seu trabalho, considera um motivo de visita ao Brasil para conhecer o mito e suas criações (ela ficou especialmente impressionada com a Casa das Canoas, no Rio).
Já com a moda, Zaha afirma ter relação "experimental" e gosto pelos japoneses como Issey Miyake e Comme des Garçons. Profissionalmente, fez mais duas incursões pelo universo fashion antes da Melissa: criou uma bolsa para a exposição "Icons", da Louis Vuitton, de 2006, e um container futurista que serve como galeria móvel para a mostra "Mobile Art", patrocinada pela Chanel, e que exibirá, em várias cidades do mundo, reinterpretações da clássica bolsa de matelassê da maison, realizadas por 20 artistas convidados. Neste momento, o pavilhão criado por Zaha deixou Tóquio e segue para Nova York.
Em entrevista por e-mail, Zaha Hadid falou sobre arquitetura, design e moda, e como os três assuntos estão interligados em seu trabalho.
A sra. tem projetos por todo o mundo. Gostaria de fazer algo no Brasil? Se pudesse escolher, que tipo de projeto e onde seria?
Eu ainda acho que não há exemplos de algumas idéias que desenvolvemos ao longo dos últimos 30 anos e que são baseadas em uma escala muito maior, não apenas na escala de uma cidade, mas em parte de uma cidade, em uma área enorme. É uma questão de idéias sobre quanto impacto é possível ter de fato em uma escala maior. Não precisa ser um prédio que é grande - mas uma série de prédios. A arquitetura é um veículo por meio do qual acho possível tratar de certas questões sociais muito importantes, evidentes nas complexidades das vidas das pessoas do século 21. Minha obra portanto se preocupa com a expansão de uma linguagem arquitetônica capaz de lidar com este aumento da complexidade. É uma arquitetura de fluidez e porosidade - com muitas camadas interligadas e usos mesclados.
Eu li que seu estúdio tem, atualmente, 100 projetos em desenvolvimento. Quais a sra. considera os mais desafiadores e por quê?
Zaha Hadid - Eu diria que temos um repertório formal muito diverso de trabalho. Nós sempre estamos interessados em expandir nosso repertório e fazer coisas diferentes em contextos diferentes, com cada projeto respondendo às suas instruções e contexto de uma forma totalmente singular. Um de nossos novos projetos mais empolgantes é o MAXXI: Museu Nacional das Artes do Século 21, em Roma. Uma coisa interessante sobre este projeto é que ele não é mais um objeto, mas sim uma progressão de espaços, o que implica que muitas funções diferentes podem ser associadas ao museu. Não é mais apenas um museu, mas um centro com muitas galerias e espaços que estão entrelaçados e superpostos uns sobre os outros. Com este projeto, nós estamos tramando uma densa textura de espaços interiores e exteriores. É uma mistura intrigante de galerias permanentes, temporárias e comerciais dentro do ambiente bastante urbano de Roma.
A sra. já idealizou projetos imensos e importantes. O que a fez se interessar em desenhar um sapato de plástico para a Melissa ou mesmo uma bolsa para a Louis Vuitton?
Nossa abordagem em relação à arquitetura, design de produto ou mesmo moda é bastante semelhante. Todos os projetos estão ligados. É possível dizer que os objetos de design são fragmentos do que poderia ocorrer em nossa arquitetura. A idéia para um prédio ou um objeto pode surgir igualmente rápido, mas há uma grande diferença no processo. O aspecto que traz satisfação no design de móveis e produtos é que o processo de produção entre a idéia e o resultado é muito mais rápido. A colaboração com a Melissa criou uma oportunidade única para continuar nossas explorações na moda. A tecnologia de ponta de injeção de plástico em molde da Melissa era ideal para a linguagem de design inteiriça que nosso escritório estava pesquisando nos últimos 30 anos. Este foi um projeto realmente prazeroso. Esperamos que as pessoas se divirtam tanto usando o sapato quanto tivemos desenhando.
A sra. já disse que a influência de Niemeyer em sua obra é forte. Qual dos projetos dele é o seu favorito?
Zaha Hadid - Eu me sinto muito afortunada por ter sido convidada à casa dele no Rio. A Casa das Canoas é uma obra-prima. Um dos princípios ao qual sempre nos mantemos fiéis em nosso escritório é trabalhar para inserir um prédio em seu contexto, por meio de uma série de relacionamentos articulados que são desenhados a partir dos elementos do ambiente ao redor. É um desafio escolher um projeto favorito. Eu realmente admiro todas as casas dele, a Igreja de São Francisco, na Pampulha, e o Ministério da Educação e Saúde. E, é claro, sua obra em Brasília.
Divulgação
Seu trabalho é definido como orgânico, desconstrutivista e com um toque de sensualidade. A sra. busca características semelhantes nas roupas que veste?
Eu realmente não visto roupas "tradicionais" há muitos anos. Meu estilo de moda é "experimental", semelhante ao estilo da minha arquitetura.
Quais são seus estilistas favoritos?
Eu sempre apreciei estilistas que ousam brincar com o material e as proporções. Eu sigo com interesse estilistas japoneses como Issey Miyake, Yohji Yamamoto e a grife Comme des Garçons. Eu gosto de descobrir novos talentos, aqui em Londres há abundância de jovens estilistas.
Para que contribuem as roupas, em sua opinião? E a arquitetura? Onde moda e arquitetura se encontram (elas se encontram?)?
Estes projetos de colaboração com a moda fornecem uma oportunidade para expressar nossas idéias em uma escala diferente e por um meio diferente. Nós a vemos como parte de um processo contínuo de investigação do design. Nós estamos explorando o potencial de uma nova linguagem de design e arquitetura - incorporando uma sensibilidade escultural onde o ritmo das dobras, nichos, rebaixamentos e saliências siga uma lógica formal coerente. Em nossos designs, nós criamos uma topologia tecida de diferentes camadas, permitindo espaços híbridos fluídos.
Fonte: Uol